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A teoria e a prática: dificuldades de estudantes da saúde na pandemia

A necessidade de formação dos alunos da área da saúde e o impacto da metodologia de ensino híbrido e presencial nas universidades.


Sala de universidades vazias diante novo formato. Imagem: Pexels - banco de imagem gratuito.


Por Alice Arueira e Mariana Trindade


A sociedade, diante da pandemia do novo Coronavírus, se viu tendo que encarar uma nova rotina, e para além das máscaras e álcool em gel, uma outra questão está afetando a vida acadêmica dos estudantes da área da saúde: como seguir com o curso no formato remoto de maneira segura e produtiva?


"Sinto um pouco o ensino prejudicado por não estar tendo o contato que deveria com os pacientes, mas ainda assim, acredito que o ensino híbrido seja a melhor saída neste período" conta Renan, estudante de medicina da UFF

O estudante de medicina da Universidade Federal Fluminense, Renan Torres, encontra-se no 9º período e conta que esse período vem sendo muito difícil para ele e seus colegas de classe. Torres explica que o papel das aulas presenciais para formação dos médicos é essencial, principalmente nos dois últimos anos da faculdade, onde as aulas são integralmente dentro dos hospitais com casos práticos.


"Eu estou no internato, penúltimo ano da faculdade. Neste momento estamos tendo a maioria das aulas práticas em formato híbrido. A UFF permitiu que o internato voltasse após 6 meses de atraso com algumas restrições, por exemplo, não podem ficar muitos alunos no centro cirúrgico, a gente só vai uma vez na semana para o ambulatório. Eu sinto um pouco o ensino prejudicado por não estar tendo o contato que deveria com os pacientes, mas ainda assim, acredito que o ensino híbrido seja a melhor saída neste período." explica Renan.


Foto do estudante de medicina Renan Carvalho durante apresentação de disciplina antes da pandemia. Acervo pessoal.


Em outro cenário, a estudante de enfermagem Raiane de Oliveira, do 8 período da UFRJ de Macaé, afirma que a falta das aulas presenciais impactam em dois quesitos: na incerteza da aprendizagem e na assistência estudantil. Ela relata ter dúvidas sobre a fixação dos conteúdos teóricos, desvinculados da prática no sistema de ensino remoto.


"O estágio está liberado pela faculdade mas por ser uma universidade de interior nós não temos um hospital universitário, e assim dependemos da política do município para aprovação dos estágios. Os alunos de medicina tiveram autorização mas os outros cursos da área da saúde ainda não, então seguimos sem experiência prática" Conta Raiane.


O número de casos da doença já passa de 13.517.808, segundo a OMS, sendo classificada como a maior crise sanitária que o Brasil já viu. Ainda sim, o isolamento social é questionado e questões como as metodologias a serem seguidas nas universidades são pautas frequentes. Tanto para aqueles que estão prestes a se formar quanto aos períodos iniciantes.


"Sinto que eu vou ser uma caloura até o quarto período, eu não conheço a maioria das pessoas que estão no meu período, não sei lidar com ligas, atividades extracurriculares", desabafa a estudante do 2º período de Fisioterapia Giovana Trindade.

Já Giovana Trindade, estudante do 2º período do curso de Fisioterapia da UFRJ, relata que se sente perdida em relação ao novo formato. Ela conta que por ser seu primeiro contato com a universidade acredita que as aulas presenciais seriam super importantes, mas ao mesmo tempo não sabe ao certo o que está perdendo no formato EAD.


"As aulas de anatomia ano passado, por exemplo, teriam sido uma oportunidade de realmente conhecer as peças anatômicas, trabalhar com o microscópio, mas eram aulas de quase 4 horas com a professora passando slides com fotos. Além disso, não tivemos contato com pacientes, ou com as áreas de atuação, como geralmente se tem no primeiro período. Não sei de que forma isso me afetará na prática", conta Giovana.


A aluna ainda relata que, além das novidades desta fase, está aprendendo a lidar com a dinâmica universitária no geral. Acredita que mesmo sendo difícil acompanhar o ensino on-line, não vê outra opção no momento, e que uma saída poderia ser aumentar a tolerância de trancamento das disciplinas durante esse tempo de pandemia.


"Sinto que eu vou ser uma caloura até o quarto período, eu não conheço a maioria das pessoas que estão no meu período, não sei lidar com ligas, atividades extracurriculares, projetos de extensão... Ou até muitas vezes com seminários." Explica a estudante de fisioterapia.


Na sociedade a visão não difere muito a dos estudantes. É reconhecido que as aulas presenciais são imprescindíveis na formação destes profissionais, mas no momento, as soluções para este período são escassas. O designer, Matheus Carvalho, vê como melhor alternativa as aulas práticas, ou seja, aulas presenciais dentro das universidades, contudo, ele diz que seria necessário adotar uma nova metodologia. Ele ressalta que esses profissionais farão falta no mercado por não estarem cumprindo com as competências necessárias no formato EAD.


"A melhor alternativa seria fazer aulas práticas dentro das próprias Universidade, abordar o máximo possível dentro dos próprios laboratórios das faculdades, em ambientes mais controlados de COVID-19. Acredito que essa seria a melhor alternativa, uma vez que esses alunos param de ter aulas práticas, a gente vai sentir daqui alguns anos a falta desses profissionais", afirma o designer.


Márcia Maria Sales dos Santos, professora do curso de Medicina da UFF, que leciona a disciplina Medicina Interna do Adulto e do Idoso, uma matéria prática, aborda o desafio de adaptação para o ensino remoto. “De início, imaginei ser impossível fazê-la virtualmente. Mas após noites de reflexão, percebi que era parar tudo ou prosseguir. Adaptei o ensino remoto apenas para estudo do conteúdo teórico demonstrativo. (...) Então os alunos foram divididos em grupos e tinham encontros semanais com seu preceptor para retirada de dúvidas, troca de vivências e demonstração das técnicas de exame físico.” e conta sobre a utilização de outras plataformas para fomentar o aprendizado, como site, conta no Instagram e canal no YouTube.


Além disso, a professora menciona outra dificuldade enfrentada: a falta da interação com os alunos. “Em minhas aulas, o que mais me angustia é o “lockdown” do aluno: câmera e microfone fechados. Será que alguém me ouve? Me compreende? Para mim, não poder olhar, ouvir e não sentir que a mensagem foi transmitida é doloroso.” Contudo, apesar dos impasses, Márcia compreende a importância desse modelo de ensino no contexto da pandemia de COVID-19, onde muitos alunos são de outros estados e não têm acesso à rede privada de saúde. Como solução, propõe que aconteça a reposição integral do conteúdo prático de sua disciplina quando o retorno às aulas presenciais for seguro.


Nesse contexto, o retorno das aulas presenciais neste momento, em que não há um plano de vacinação vigente para toda a população, pode ser um risco à saúde de professores, alunos e responsáveis. Nas escolas de ensino fundamental e médio que já houve regresso desta prática, muitas precisaram fechar as portas após a constatação de casos da doença. Também há a discussão sobre o modelo híbrido de ensino, metodologia que combina aulas presenciais e remotas. Em síntese, é um assunto que tem gerado muitas polêmicas, não existindo um consenso total sobre as formas de ensino na área da saúde no contexto da pandemia.


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