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Direitos Humanos e os trabalhadores das ruas: tensões e limitações entre teoria e prática

Atualizado: 17 de mai. de 2024

Bruna Navarro, integrante do EMERGE. Mestranda em Mídia e Cotidiano | Cientista Social e Jornalista pela Universidade Federal Fluminense UFF.


O embate entre camelôs e a ordem pública, da Prefeitura do Rio, é histórico e tem ocupado as páginas e minutos preciosos do noticiário fluminense, em especial, nos últimos meses, com as discussões envolvendo a Feira de Acari, na Zona Norte, e a Uruguaiana, no centro da capital.


Em janeiro deste ano (2024), os cariocas viram o prefeito do Rio, Eduardo Paes, anunciar através da rede social X (antigo Twitter) que proibiria o funcionamento da Feira de Acari, tradicional comércio popular na Zona Norte do Rio. A decisão foi publicada em Diário Oficial, no dia 23 do mês de janeiro.



A publicação afirma que foi constatada, segundo a prefeitura, em toda a extensão da Feira de Acari, a venda de eletrodomésticos, equipamentos eletrônicos, alimentos não perecíveis, medicamentos, calçados, bem como roupas de lojas de departamento pela metade do preço e de “origem desconhecida”.


Um mês depois, o prefeito Eduardo Paes (PSD) anunciou, também pelas redes sociais, que faria valer a proibição de ambulantes na Rua Uruguaiana, no Centro do Rio. De acordo com o prefeito, a decisão foi tomada em conjunto com o governador Cláudio Castro (PL). O argumento para as modificações na via e para a proibição foram os mesmos da Feira de Acari, o combate a eventos ilegais – sem a devida autorização municipal -, além do combate à venda de produtos sem procedência e ao crime organizado.


No meio das decisões inúmeros camelôs sem poder trabalhar. Há nuances importantes a serem trazidas à luz para discussão. O relatório “Camelôs: panorama das condições de trabalho de homens e mulheres no Centro do Rio de Janeiro”, publicado pelo Observatório das Metrópoles (2019), coletou e organizou informações a respeito das condições de trabalho e das reivindicações de homens e mulheres camelôs que trabalham na capital fluminense.


Ao se debruçar sobre as reivindicações e sobre os inúmeros relatos de violência dos trabalhadores, é possível verificar que a opressão empregada pelo poder público - aqui representado pela Secretaria de Ordem Pública e pela Guarda Municipal da Prefeitura - tem como fundamento discursivo a garantia da “ordem”. Isso se evidencia ao passo que observamos o posicionamento da secretaria, através de notas, nas inúmeras matérias que preencheram nosso noticiário acerca dos casos de Acari e da Uruguaiana.











Gênero e Camelô


O relatório, construído com colaboração do Movimento Unido dos Camelôs (MUCA), é um ponto de partida de reflexão a respeito da relação entre gênero, direito e trabalho a partir da realidade de homens e mulheres que trabalham como camelôs na capital fluminense.


No Brasil, as mulheres pretas ou pardas são mais afetadas pelas desigualdades na educação, no mercado de trabalho e na renda do que as mulheres brancas. Elas ainda são as pessoas que dedicam mais tempo aos afazeres domésticos e aos cuidados de pessoas. Os dados fazem parte do estudo Estatísticas do Gênero, divulgado pelo IBGE, no Dia Internacional da Mulher (8/03).


O levantamento realizado pelo Ippur/UFRJ traz reflexões importantes para o debate, como é o caso do recorte de gênero ao se pensar nos trabalhadores camelôs.

O enfoque de gênero adotado na pesquisa tem como objetivo lançar luz sobre as particularidades que marcam e condicionam as experiências de mulheres que trabalham nas ruas. Parte-se do entendimento de que suas vivências na cidade assumem modulações particulares ao se combinarem com as desigualdades de gênero e raça que constituem e são constituídas pelas relações sociais em nossa sociedade, e que conformam de uma maneira muito específica as formas pelas quais as mulheres, notadamente as mulheres não brancas, vivenciam suas experiências cotidianas. (Observatório das Metrópoles, “Camelôs: panorama das condições de trabalho de homens e mulheres no Centro do Rio de Janeiro”. 2019, p. 6)


Direitos Humanos para "Humanos Direitos"?


A Agenda 2030 da ONU, com base nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, pode ser um termômetro de avaliação de que a situação das mulheres camelôs exige uma maior atenção, como indicam os seguintes ODS:

Objetivo 3. Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades;

Objetivo 4. Assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos;

Objetivo 5. Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas;

Objetivo 8. Promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todos;

Objetivo 9. Construir infraestruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação;

Objetivo 10. Reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles


Basta percorrer os olhos rapidamente pelos resultados da pesquisa realizada pelo Ippur/UFRJ para se perceber que há muito por fazer ainda, para os trabalhadores camelôs, em especial para as mulheres camelôs, que no em geral vivem uma realidade bastante distante da realidade objetivada pelos ODS.


Acesse o Instagram do Grupo de Pesquisa Emerge e saiba mais sobre as pesquisas desenvolvidas.


Referências


SANTOS ALMEIDA, D. . Gênero, Direito e Trabalho: Uma abordagem desde a zona do não ser e a construção de uma metodologia para efetivação dos direitos humanos. Revista Inclusiones, v. 8, n. Esp., p. 259-280, 28 abr. 2020.


Observatório Das Metrópoles Ippur/Ufrj; Movimento Unido Dos Camelôs. “Camelôs: panorama das condições de trabalho de homens e mulheres no centro do Rio de Janeiro”. Rio de Janeiro: Observatório Das Metrópoles Ippur/UFRJ. 2019. http://observatoriodasmetropoles.net.br/wp/wp-content/uploads/2019/02/Relat%C3%B3rioCamel%C3%B4s-na-%C3%A1rea-central-jan-2019.pdf. Acesso em 10 abr. 2024.


Organização das Nações Unidas. Transformando o nosso mundo: a agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável. Nova Iorque: UN; 2015. https://nacoesunidas.org/wp-content/uploads/2015/10/agenda2030-pt-br.pdf. Acesso em 12 abr. 2024.


 
 
 

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