Liberdade de Expressão como Direito Humano: Os Interesses do Capital em Espaços Conspiratórios

Andressa Garcez, integrante do EMERGE.

Elon Musk criou seu próprio playground. A Rede Social X, antigo Twitter, foi adquirida pelo bilionário sul-africano-canadense em uma árdua negociação que ocorreu ao longo de 2022. Desde o total rebranding (conceito publicitário que remete à reformulação de uma marca em vários aspectos, como slogan, logotipo e manual de marca), os algoritmos do X vem sofrendo rápidas atualizações em sua engrenagem.

Imagem: Pixabay / Mohamed Hassan

De cara, o antigo Twitter passou a pagar usuários de acordo com a visibilidade, como outras redes sociais costumam fazer. A plataforma agora conta também com a função de upload de vídeos longos com mais de 30 minutos e além disso, o planejamento para as próximas atualizações é de um serviço de pagamentos interno ao X. É uma tentativa da rede de integrar diversas funções dispersas em outros canais para se tornar essencial no cotidiano do usuário. Ainda é possível que uma das maiores articulações previstas pela compra do Twitter seja a reativação, por parte de Musk, de contas banidas que violavam as diretrizes da plataforma à época. Este movimento apresentou-se como um alerta vermelho à política de liberdade de expressão irrestrita proposta pelo empresário e, recentemente, toma novos contornos no Brasil, com embates entre ele e a Justiça Federal Brasileira.

Foi preciso que Alexandre de Moraes, Ministro do Supremo Tribunal Federal, incluísse o bilionário no inquérito de investigação contra milícias digitais, numa tentativa de preservar a decisão estabelecida e abarcar o “assédio direcionado às instituições brasileiras”, segundo Daniela Lima, jornalista da Globo News, que analisa o caso. Musk ameaça liberar contas restritas pela lei no que, à primeira vista, são ações que aparentam proteger o direito humano à sua própria expressão, mas rapidamente, cavam terreno fértil para produção de teorias conspiratórias com ares de verdade. Neste caso, torna-se evidente a grande energia, o planejamento e o capital envolvidos nos mecanismos de produção das bolhas informacionais, bolhas estas que afastam o indivíduo de dados factuais e o aproximam do bombardeio de fake news. Quanto mais usuários participam e consomem de suas bolhas desinformativas, maior a convicção no que é recebido, maior também o engajamento e lucro das plataformas.

O ambiente discursivo está intrínseco à política e a múltiplas esferas sociais (porque nasce delas e a elas retorna), e nem sempre a relação entre liberdade de expressão e razão tem contornos positivos no que se refere a extrapolar limites sociais irrevogáveis. Esta é a evidente preocupação de Daniela Lima porque, para ela, a liberdade de expressão está sob ameaça no Brasil quando Musk se propõe a “ser um cavalo de tróia”, pois “estica a corda e passa a desobedecer uma ordem judicial, a atacar as instituições e a fazer alegações falsas”. Utiliza até mesmo o Marco Civil da Internet para proteger-se da iniciativa judicial e, como apontado por Lima, é uma tática para que a Justiça seja obrigada a reagir e o bilionário alegue uma suposta perseguição contra a liberdade à sua maneira.

A jornalista ainda levanta que “uma parcela da população já está investida na seara do ridículo” e acredita estar vivendo sob uma ditadura judicial em voga no Brasil, referindo-se a ações como a suposta censura de perfis da deputada federal Carla Zambelli, que teve suas contas restritas por determinação do TSE. A deputada ainda tentou burlar a decisão criando novas contas e as divulgando, no que prontamente foram banidas e juntou-se ao coro da ditadura informacional no Brasil. O que Musk propõe, portanto, funciona como um dog whistle para as bolhas conspiratórias conservacionistas que estão em constante frenesi em busca do próximo direito humano a ser questionado ou modificado, com as soluções partidas de sua própria base. Cria-se o problema, apresenta-se a solução, torna-se o herói.

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